sexta-feira, 28 de março de 2014

Marcelo Jorge, porque Fagá era profissional



Na cozinha

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- Vamos fazer um bacalhau?
(Quando ele dizia vamos, ele usava o plural majestático, referia-se a mim, naturalmente.)
- Não quero, estou com preguiça.
- Eu faço.
- Então, faça.

Havia um supermercado Eldorado no final da rua Pamplona que tinha uma excelente seção de importados. Volta o Marcelo com o bacalhau, vinho verde português de que gostava muito, batatas, couve, ovos e alho. Ele vai fazer o bacalhau, mas...

- Crisê, como faz para tirar o sal?
- Bota na água, né Marcelo.
- Quanto tempo?
- De um dia para o outro.

Vinho aberto, televisão ligada, Cristina lendo. Dia seguinte, sábado, acordo tarde, crianças também, baita cheiro de bacalhau na casa inteira. Marcelo vendo televisão, bacalhau cozinhando.

- Crisê, vem ver. Como faço os legumes?
- Cozinhe o ovo separadamente. Ferva a água e coloque os legumes. Vá tirando à medida que fiquem macios.

Nova ida ao supermercado, dessa vez o vinho é tinto.

- Bacalhau pronto.
- Oba.
- Ficou bom?
- O bacalhau, sim, mas os legumes estão horríveis.
- É. Cozinhei na água em que demolhei o bacalhau para dar um saborzinho extra.

Esclarecendo a TV

Ao contrário de mim, Marcelo era viciado em televisão. Chegávamos de viagem, segurava a porta do elevador com uma mala, entrava em casa, ligava a TV e só depois punha a bagagem para dentro. Assistia a todos os noticiários possíveis, jogos de futebol, todos, esportes em geral, até campeonato de sinuca. Foi o único "não" redondo que lhe dei: TV no quarto, jamais. Ele fazia tudo diante da TV: comia, bebia, falava ao telefone, trabalhava, lia, estudava. Eu só mandava na TV quando assinamos o cabo e às 8 e 30, terminado o Jornal Nacional, mudava para a HBO que sempre transmitia um filme nesse horário. Quando ele estava em casa, a TV ficava ligada 24 horas por dia.